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Fale com especialistas | Entrevista com Fernando Zamora

Tivemos o prazer de partilhar uma sessão técnica com Fernando Zamora, Presidente da Comissão de Enologia da Organização Internacional do Vinho – OIV, a quem pedimos para partilhar com a nossa comunidade online os seus conhecimentos sobre alguns temas relevantes.

O Fernando foi nosso convidado de honra na inauguração da Vinoteca da Agrovin, um espaço para partilhar e descobrir oportunidades sobre a enologia do futuro que criámos e que teve início no mês passado em Montpellier, França, com um tema da atualidade, a saber as alternativas ao enxofre nos vinhos rosés e a nova regulamentação, algo sobre o qual o Fernando tinha muito para falar e aqui vos deixamos um excerto:

 

1.- A tendência do mercado é para o consumo de vinhos com baixo teor de enxofre e mesmo a sua substituição absoluta. Sabemos que é um tema aborrecido, mas poderia dar-nos a sua opinião técnica sobre o ponto em que nos encontramos no que diz respeito à produção de vinhos com baixo teor em sulfito ou 0% de sulfito?

Claro que, a tendência atual é no sentido da elaboração de vinhos com pouco sulfito ou quase nenhuns sulfitos. Não é nada fácil, implica um controlo muito mais rigoroso a nível vitícola, uma vez que as uvas têm de ser perfeitamente saudáveis, caso contrário é uma loucura tentar usar doses baixas de sulfitos ou pouco sulfito e, por outro lado, também tem de ter muito mais higiene e muito mais controlo na adega. Implica trabalhar mais, produzir com baixo teor de enxofre não consiste em baixar as doses, consiste em alterar os protocolos, definitivamente.

 

2.- Para a conservação do vinho, o enxofre oferece 3 propriedades essenciais: antioxidásica, antioxidante e antimicrobiana. Que 3 produtos enológicos destacaria de todos aqueles que explicou e que podem contribuir para reduzir a concentração de dióxido de enxofre e, em termos de técnicas físicas, existe algum que possa contribuir para reduzir o uso de dióxido de enxofre?

Distinguindo o que são propriedades para proteger o vinho da oxidação, quer seja enzimática ou química, eu destacaria a utilização de gases inertes. É uma técnica conhecida, custa dinheiro, tem de trabalhar com muito rigor, mas funciona muitíssimo bem se for aplicada corretamente. Eu também falaria acerca da utilização de glutationa e também da utilização de taninos enológicos que podem realmente proteger o mosto da oxidação.

Quanto à proteção do vinho, devemos também trabalhar com gases inertes, e no que diz respeito à proteção contra a oxidação, podemos usar as próprias borras, para além dos taninos enológicos, e ao mesmo tempo podemos usar um controlo rigoroso do oxigénio que fornecemos nos processos de trasfega e deslocação.

Finalmente, no que diz respeito às propriedades antisséticas, gostaria de destacar a recente aprovação do ácido fumárico, que nos pode permitir inibir as bactérias lácticas de usar enxofre. Em seguida, falaria das possibilidades do quitosano e outras técnicas como o ozono ou as altas pressões como coisas a realçar maioritariamente.

 

3.- A nível técnico, sabemos que hoje em dia é muito complicado eliminar 100% de dióxido de enxofre durante a produção ou conservação do vinho, se quisermos produzir um vinho comercial com todas as garantias. Na sua opinião, que técnicas ou produtos enológicos deveriam ser desenvolvidos ou melhorados para atingir o objetivo de 0,0% de enxofre?

É um pouco o que já mencionamos na pergunta anterior, mas eu diria que a glutationa tem um grandioso futuro. Nesse caso também falaria sobre a utilização de gases inertes, do ozono e, evidentemente, de taninos enológicos e talvez de qualquer outra substância ou processo capaz de inibir as enzimas de polifenol oxidase e também que possa ser utilizado para eliminar o oxigénio dissolvido no vinho.

Em termos de propriedades antisséticas, acredito que o quitosano e o ácido fumárico são muito úteis, e talvez uma combinação de ambos os produtos possa ter um amplo aspeto antibacteriano, que são os principais problemas que podemos ter a um nível microbiológico.

 

4.- Acha que baixos níveis de enxofre, ou ausência de enxofre, é uma moda passageira ou está aqui para ficar?

Eu penso que a intervenção mínima vai desaparecer, é uma coisa pontual.

Uma coisa é abusar das “misturas”, o que por vezes é exagerado, e outra é usar o necessário para que o nosso vinho seja o melhor possível.

Uma uva maravilhosa num ano maravilhoso não requer quase nada, apenas um pouco de controlo e produziremos um vinho fantástico. Mas infelizmente nem sempre é este o caso. A obrigação do enólogo é fazer o melhor vinho possível usando técnicas autorizadas e lícitas.

As alterações climáticas estão a afetar-nos e apesar disto, penso que estamos a fazer vinhos melhores agora do que há 20 anos. Adaptámo-nos, sabemos muito mais e podemos realmente compensar os efeitos das alterações climáticas se não progredirem. Eu diria mesmo que algumas zonas do nosso país e de outros países beneficiaram das alterações climáticas porque há 20 ou 30 anos atrás algumas vinhas não amadureciam bem e agora amadurecem de forma excelente. O que acontece é que “quando vir a barba do seu vizinho aparada, ponha a sua de molho”, por isso o que pode ter beneficiado algumas vinhas, dentro de 20 anos pode prejudicar-nos e nós temos de estar preparados. Mesmo assim, ao contrário de outros produtos agrícolas, o vinho é agora muito melhor do que era há 20 anos atrás no nosso país, enquanto que o tomate é muito pior (ri-se).

 

 

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